Desde o século XIX, quando se inventou a modernidade escolar e pedagógica, mais de cem anos se passaram e, embora admitamos que a escola de hoje é infinitamente melhor do que a escola de ontem, em muitos aspectos a escola ainda vive com retraimento nas fronteiras da modernidade.
Com o Processo de Bolonha e construção do espaço europeu de Ensino Superior, a duração dos cursos e os planos de estudo foram adequados, discutiu-se a estrutura das Instituições, o seu financiamento, as carreiras docentes e esqueceu-se verdadeiramente o que Bolonha tinha de melhor para oferecer, nomeadamente, as reformas de pedagogia e a oportunidade de rever e orientar metodologias e objectivos de ensino e aprendizagem.
Não há segredos na constituição de uma boa escola, não há mistérios indecifráveis. E a manifesta incapacidade que o País tem revelado em concretizar políticas desenhadas num papel de boas intenções, acredito que se devam simplesmente às condições históricas, políticas e sociais reinantes, não mais que o nosso estágio de desenvolvimento a ver-se ao espelho.
Enquanto processo multilateral, porque envolve variados países e parceiros sociais, a realidade de Bolonha tinha como objectivo alterar profundamente o panorama de Ensino Superior, tendo em vista uma maior competitividade internacional, melhoria da empregabilidade e mobilidade dos cidadãos.
O desejo de um País melhor e mais desenvolvido a todos os níveis passa necessariamente pela sua Educação de Qualidade.
Acompanhar a Europa é fundamental, mas aprender e ensinar. Imitamos sempre, mas também temos de nos consciencializar que podemos ensinar e aproveitar ocasiões como esta para mostrar originalidade e carácter para criar um feitio próprio.
Contudo, as conclusões demonstram que esta implementação não passou de um processo burocrático de operação cosmética dos cursos, tendo-se passado ao lado de mais uma oportunidade.
Inclusivamente, em muitas Instituições por esse país fora, das insuficiências normativas dos documentos “Regras de Transição de Bolonha” criaram-se problemas reais, concretos, pungentes e prementes aos quais foi necessário dar respostas, do ponto de vista pedagógico, científico e jurídico simultaneamente.
Sem dúvida que este “passar ao lado” de reformas é também culpa dos alunos que vêem cada vez mais as Faculdades no seu sentido mais imediato de “ciência professada na Universidade”,
Acredito que a sociedade urbana portuguesa, toda em conjunto, é que tem vindo a criar uma geração protegida que dificilmente assume compromissos e sem grandes opções de escolhas de futuro e, talvez por isso mesmo, se sinta permanentemente insatisfeita.
A situação sobrante desta verosimilhança é a criação das Faculdades como um tempo da vida transitório, por vezes associado, por diversas razões, ao desagrado e frustração dos seus discentes.
Ao invés, o tempo que se passa nas Faculdades devia ser antes encarado como um modelo circunstancial de uma parte de nós mesmos, enquanto etapa de crescimento e porção orgânica do que somos. Tempo em que, do princípio ao fim, se procura decifrar um mundo de experiências, esforço e autonomia.
Apelidada como o “ tempo das nossas vidas ”, a Faculdade molda-se na aprendizagem: da profissão que vamos exercer, do que é a vida, de conhecer outros e outras formas de pensar e de conhecermo-nos a nós próprios.
Como tal, a primeira responsabilidade de uma instituição universitária deve de ser o acolhimento e a integração dos seus estudantes e a qualidade da formação que lhes presta.
Impõe-se por isso fornecer a todos os estudantes uma formação humanística e científica de base (no plano internacional, é esta “liberal education” que distingue as melhores universidades e que está na origem da sua reputação e prestígio), implementando uma flexibilidade curricular desde o primeiro ano, repensando o papel das disciplinas de base das Letras, das Ciências e das Artes na formação universitária e igualmente aprofundar a vivência dos campus universitários, consolidando iniciativas culturais, artísticas e desportivas (a título de exemplo, não deveria existir nenhum curso que não contemplasse a actividade física – ex.: natação - uma vez por semana).
De inúmeras formas se podem relacionar as palavras saúde e ensino. Ainda assim, a questão de hoje é quanto tempo mais será preciso para recuperar a "saúde" dos sistemas educativos?
A resposta que procurei dar não é uma conclusão, é apenas uma exortação para reflectir sobre os aspectos da docência e dos processos de ensino e aprendizagem quando o tema é ensino “saudável”.
Toda a mudança vem sempre associada a ambição e a resistência. Ambiciosa porque exige sempre uma séria e exigente avaliação da situação actual, bem como coragem e vontade política para concretizar os projectos e resistente porque se luta muito para que tudo mude ficando tudo igual, característica tão querida das atávicas instituições públicas nacionais.
E, assim, para já, ainda seguimos prisioneiros de um sistema de ensino pensado para formar cada um à medida do lugar profissional que lhe está destinado, em vez de afecto a um conceito de valorização pessoal e de qualificação escolar para todos.
Por cumprir, ainda há um universo de (ir)realizações! E é aqui que devemos encontrar a nossa motivação.
“eu tlim ciências
tu tlim matemáticas
ele tlim trabalhos manuais
nós tlim recreio
vós tlim senhora
eles tlim castigo”
“eu tlim ciências
tu tlim matemáticas
ele tlim trabalhos manuais
nós tlim recreio
vós tlim senhora
eles tlim castigo”
Mário Cesariny
Publicado na Revista +SaúdeMagazine em Outubro 2008
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