Normalmente, nestas linhas que tanto prazer me dão escrever, se tem falado sobretudo acerca de dentes, cirurgia, estética e tratamentos actuais que os avanços da tecnologia e da medicina permitiram. Hoje, porém, o objectivo central foi outro. Foi o de prevenir e sensibilizar.
Um total de 1,399,790 novos casos de cancro com 564,830 mortes consequentes era esperado nos Estados Unidos no ano de 2006. Desde 1999, o cancro, quando agregado por idade, parece ter ultrapassado a doença cardíaca como a principal causa de morte para idades inferiores a 85 anos. Actualmente, uma em cada 4 mortes é resultado de cancro.
A doença cancerígena é caracterizada por um crescimento descontrolado e ininterrupto de células neoplásicas aberrantes. As células cancerígenas fazem uma invasão destrutiva dos tecidos através de uma extensão para locais à distância por metástases.
(A Torre de Babel, Pieter Brueghel, 1563, um paradigma do crescimento descontrolado)
Entre os homens, o cancro da próstata (o mais prevalente), dos pulmões, dos brônquios, do cólon e do recto somam um total superior a 56 % de todos os novos cancros diagnosticados. Nas mulheres, o cancro da mama continua a ser o mais prevalente.
No ano de 2005, a American Cancer Society relatou aproximadamente 31 000 cancros da cavidade oral e faringe e 7500 mortos devido a esta doença.
Em média, 95 % dos cancros orais são encontrados em doentes com mais de 40 anos e diagnosticados aos 65.
Durante as últimas 5 décadas a taxa de sobrevivência a cinco anos não tem sofrido alterações. Aproximadamente 47 % dos doentes com carcinoma da cavidade oral ou faringe e 44 % na laringe sucumbem à sua patologia 5 anos após o diagnóstico.
O cancro oral inclui uma variedade de neoplasias malignas que poder ocorrer em qualquer localização anatómica da cavidade oral (língua, mucosa, lábio (…)).
O consumo de álcool e tabaco são os factores de risco para o cancro oral mais frequentes no mundo ocidental e outros incluem o estilo de vida e algumas patologias concomitantes como a sífilis ou situações de imunosupressão.
(Crânio com Cigarro, Van Gogh, 1885)
O plano de tratamento oncológico resulta de uma conferência multidisciplinar de várias especialidades médicas e da aprovação do mesmo pelo doente e/ou familiares. Este é baseado no estadio tumoral, obtido através do exame intra-oral, biopsia e estudos radiológicos e da idade do doente. As modalidades de tratamento consistem na quimioterapia, radioterapia e a cirurgia ablativa do tumor.
A ressecção cirúrgica destas lesões malignas no maxilar superior, pela sua extensão, pode provocar comunicações da cavidade oral com as fossas nasais, que podem comprometer a totalidade do palato duro e mole (“céu da boca”). Isto pode originar refluxo de fluidos e voz nasalada, com algum comprometimento do ponto de vista social.
Relativamente aos tumores da mandíbula, a extensão é variável consoante o tumor. Mas mesmo em estadios pouco avançados, a cirurgia na base da língua tem normalmente um impacto negativo na fala e deglutição.
Além disso, ao contrário de outras regiões do corpo, a cabeça não pode ser escondida e, perante defeitos adquiridos, a modelação estética fica inexoravelmente comprometida.
Na doença oncológica os doentes passam por um processo longo e complexo, que os afectam do ponto de vista psicológico, seja pela afectação psico-social e reacção perante a doença diagnosticada ou perante a perda de estruturas anatómicas que vão influenciar a sua vida normal, nomeadamente na fala, na mastigação e na estética.
Em Portugal registam-se cerca de 1500 casos novos de cancro oral por ano (1200 homens e 300 mulheres).
Uma elevada percentagem de casos de cancro oral são diagnosticados no estadio T3/T4 (uma fase tardia e extremamente avançada) pelo que os esforços que têm vindo a ser feitos para a detecção precoce não têm apresentado os resultados desejados.
O médico dentista tem um papel fulcral nesta patologia, tanto no rastreio, como no diagnóstico primário, aconselhamento em relação aos factores de risco e fazer um acompanhamento do doente durante e após o tratamento.
É fundamental que faça a sua consulta regular de 6 em 6 meses e exija que o seu médico dentista/higienista oral realize o seu rastreio de cancro oral.
Sorria para si: observe o lábio superior e inferior, parte exterior e interior, incluindo as gengivas, o interior das bochechas, a garganta e o palato (céu da boca).
Observe também a língua por cima, nos lados e por baixo, incluindo o pavimento da boca. Palpe ainda suavemente a face e o pescoço, na procura de nódulos aumentados.
Não deixe de julgar estranho se, eventualmente, aparecerem tumefacções, alterações de cor e manchas na cavidade oral que se mantenham por mais de 15 dias e consulte imediatamente o seu médico dentista. Ele realizará o seu diagnóstico ou encaminhará para uma unidade especializada.
Como escreveu um dia Benjamin Franklin: "A pessoa pode adiar, mas o tempo não." A eliminação prévia dos factores de risco, como o álcool e o tabaco, e/ou a detecção do cancro oral de uma forma precoce são critérios fundamentais, tendo em vista, por um lado, prevenir e, por outro, diagnosticar o tumor num estadio menos descontrolado e, desse modo, o tratamento poder contribuir para maiores taxas de sobrevivência dos doentes.
Cancro significa caos e desordem. Desordem no viver, no sentir e no pensar. É uma outra Torre de Babel. Seriamente, previna-se.
2 comentários:
Caro Fernando,
não podia deixar de comentar este texto visto que o cancro tem sido uma presença constante no seio da minha família e amigos. Para mim, é uma doença que nos obriga a pôr em perspectiva toda a nossa vida e que nos prova as nossas forças e fé. No caso particular do cancro oral, impressiona-me a falta de informação que passa para a população sobre as formas de prevenção e a necessidade de um diagnóstico precoce. No entanto, como referia (e muito bem), as marcas que deixa são demasiado visíveis numa sociedade onde a beleza e a estética se têm tornado cada vez mais importantes. É, portanto, de louvar todas as divulgações desta doença e, neste caso, a sua divulgaçao.
Continue o bom trabalho!
Francisco António
Novamente obrigado pelo seu comentário. Não sei se ja teve oportunidade de ver a resposta que lhe deixei no outro? Fiquei curioso relativamente a qual seria a sua profissão.
É verdade... O cancro oral é uma consequência nefasta em qualquer individuo. E impressionante é o estado avançado da doenças em que as pessoas nos chegam. Como podem adiar durante tanto tempo uma coisa tao desconfortável e tão visivel? Urge que existam mais medidas de prevenção e de rastreio e diagnóstico precoce, ainda para mais numa população altamente concentrada nas bebidas alcoólicas e tabaco.
Continue a comentar,
Um abraço
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