segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Falar em público

Mais do que as alturas, falar perante grupos de pessoas ou plateias é recorrentemente considerada das primeiras coisas que se afirma temer.
A razão da exposição e a clara passagem da mensagem e, consequentemente, o que a assistência vai sentir e fazer são tudo questões sem resposta, até acontecerem.

A maior parte, senão todas, as exposições públicas encontram-se numa das três categorias: convencer, informar ou divertir. E o objectivo da maioria dos oradores inclui una combinação destas três.
Wodie Allen foi o primeiro a dizer “Primeiro fá-los rir e depois terás toda a sua atenção”. É uma receita importante até porque o humor pode ajudar a estabelecer uma relação amigável com a assistência. Contudo, difícil, pois como o humor tem de ser original, pode ser muito sintomático no discurso não recuperar da sensação desagradável provocada por a audiência ter fingido que achou graça.
O mais importante acho que é mesmo a qualidade. Já todos ouvimos brilhantes discursos e já todos ouvimos também péssimos discursos. Já todos assistimos a fantásticas palestras e já todos “adormecemos” também em aborrecidas palestras. Já todos tivemos aulas na faculdade imperdíveis e já todos tivemos cadeiras que não pusemos os pés numa aula (não corresponderão necessariamente as minhas faltas às de outros, pois aí vem a velha máxima “que gostos não se discutem”).
É óbvio que há também coisas básicas que não se podem fazer, tais como introduções muito palavrosas, pressas para chegar ao final, terminar com murmúrios finais e, pior que tudo, falta de boas maneiras, mas cedo aprendi a lição de que é sempre melhor ouvir um verdadeiro conhecedor, uma fonte inesgotável de saber, do que um bom pedagogo nada conhecedor.

Nunca é mau ser-se um bom orador (há a excepção de depois os ouvintes serem sempre exigentes), mas ninguém nasce ensinado, simplesmente há alguns que têm mais jeito que outros. Porque praticam? Muitos oradores inexperientes evitam este passo porque pode ser assustador, mas é lógico que a prática e a coragem ajudam.

É claro que a prática e a coragem permitem que se adquira mais confiança, que se introduzam e concluam os assuntos com mais veemência e que se utilize eficazmente a linguagem, conquistando, com mais credibilidade, as assistências. Porém, não há nada como acreditarmos mesmo naquilo que dizemos: aquilo que não é proferido, por vezes, diz mais que as palavras.

E mesmo depois de alguns anos de experimentação de “confronto” de distintas e exigentes plateias, o nervoso miudinho e o joelho que treme estão lá sempre. São depois facilmente ultrapassados pelo início e pela experiência, mas, para quem nunca experimentou, fique sabendo que só mesmo nos dias em que se sobe ao palanque é que se tem noção do tamanho da sala.

Cada homem tem a sua canoa

É com grande honra que escrevo neste espaço privilegiado, local onde poetas, cientistas, exploradores, músicos e pensadores de todo o mundo, imortais de todos os tempos, se reunem aqui nesta mesa. Para a minha primeira publicação escolhi homenagear um herói dos nossos tempos.
Hoje chega até nós Amyr Klink, explorador, aventureiro, escritor e comandante de embarcação. Amyr Klink nasceu em São Paulo no dia 25 de Setembro de 1955, filho de pai libanês e mãe sueca. Começou a frequentar a região de Paraty, no estado do Rio de Janeiro com a família quando tinha apenas dois anos de idade. Esta cidade histórica do litoral brasileiro é o lugar que o inspirou a viajar pelo mundo. Desde 1965 que é coleccionador de canoas antigas, e talvez essa paixão infantil por canoas fosse a antecâmara para a grande paixão da sua vida adulta: a de navegar sozinho.

Em 1978, realizou a travessia solitária de Santos-Paraty em canoa e em 1980 realizou de catamaran o trecho Paraty-Santos e Salvador-Santos, igualmente em catamaran durante 22 dias. Ambas aventuras seriam meramente treino para o feito que iria permitir que escrevesse o seu nome na história: este ocorreu entre o dia 10 de Junho a 19 de Setembro de 1984 quando realizou a travessia solitária, num barco a remo, do Oceano Atlântico! Foi um percurso de sete mil quilómetros entre Luderitz, Namíbia e Salvador, na Bahia. Foram exactamente 100 dias que Amyr demorou a alcançar essa façanha inédita, descrevendo na perfeição a viagem com todos os sobressaltos e imprevistos a serem pormenorizadamente relatados no seu livro "Cem dias entre céu e mar".

Constantemente insatisfeito e com o impossível no seu horizonte, iniciou, em Dezembro de 1989, o Projecto de Invernagem Antárctica, mais uma vez em solitário, a bordo do veleiro polar "Paratii", quando percorreu 27 mil milhas da Antárctica ao Ártico, em 642 dias. Os livros "Paratii - Entre dois pólos" e "As janelas do Paratii" relatam e ilustram esta aventura. A 31 de Outubro de 1998 abraçou mais um projecto inigualável: "Antárctica 360" - uma volta ao mundo pelo caminho mais difícil: a circunavegação em torno do continente gelado. Durante 79 dias, Amyr Klink enfrentou sozinho os mares mais imprevisíveis do planeta e muitos icebergs. É no livro “Mar sem Fim” que se encontra o relato desta viagem.

Que as suas viagens e façanhas nos inspirem, a todos, a viajar mas também que as nossas viagens nos tornem ainda mais sonhadores e humildes pensadores... passo agora a palavra a quem já esteve, está e estará para sempre em movimento, qual rapazinho de 10 anos, na sua eterna canoa:

“Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias e imagens, livros ou televisão. Precisa viajar por si, com seus olhos e com os seus pés. Para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio tecto. Um homem precisa de viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e ir simplesmente, ver.” Amyr Klink